LLMs em Produção: Por que 90% dos Projetos de IA Falham (e Como Estar nos 10% que Dão Certo) | Sérgio Berlotto
LLMs em Produção: Por que 90% dos Projetos de IA Falham (e Como Estar nos 10% que Dão Certo)

LLMs em Produção: Por que 90% dos Projetos de IA Falham (e Como Estar nos 10% que Dão Certo)

IA

Semana passada recebi uma ligação de um CEO perguntando se eu poderia “colocar um ChatGPT” no sistema deles. Quando perguntei para que, a resposta foi: “não sei, mas todo mundo está fazendo”. Essa conversa me fez refletir sobre o abismo que existe entre o hype dos LLMs e a realidade de colocá-los para funcionar de verdade.

A verdade é que estamos vivendo um momento curioso. Por um lado, temos uma tecnologia genuinamente revolucionária. Por outro, temos uma avalanche de projetos fracassados, orçamentos estourados e expectativas frustradas. E não é porque a tecnologia não funciona – é porque estamos aplicando ela nos lugares errados.

Depois de 24 anos mexendo com software e alguns meses batendo cabeça com LLMs em produção, posso dizer: o problema não está na IA, está na nossa forma de pensar sobre ela.

O que são LLMs, afinal? (sem a parte chata)

Antes de mergulhar no que funciona e no que não funciona, vamos esclarecer uma coisa: LLM é basicamente uma sigla bonita para “modelo de linguagem grande”. Na prática, é um software treinado com uma quantidade absurda de texto que consegue prever qual palavra vem depois de outra com uma precisão impressionante.

Pense assim: é como se você pegasse uma pessoa super inteligente, fizesse ela ler a internet inteira, e depois pedisse para ela completar suas frases. Ela não “sabe” das coisas no sentido tradicional, mas consegue fazer conexões muito sofisticadas entre conceitos.

O pulo do gato está em entender que LLMs são ferramentas de processamento de linguagem natural, não oráculos mágicos. Eles são excepcionais para transformar dados não estruturados em informação útil, mas, em geral, muito ruins para ser fonte única da verdade.

Onde LLMs realmente brilham (casos de uso com ROI comprovado)

Agora vem a parte boa. Depois de testar várias implementações, tanto sucessos quanto fracassos, identifiquei alguns padrões do que funciona de verdade.

Automação de documentação técnica

Sabe aquela dor de manter documentação atualizada? LLMs são fenomenais nisso. No meu time, implementamos um processo que lê nossos commits, analisa mudanças no código e atualiza automaticamente a documentação. O que antes tomava horas da equipe agora acontece em background.

O ROI aqui é brutal: desenvolvedores gastam em média 20% do tempo procurando ou escrevendo documentação. Reduzir isso pela metade já paga a conta da IA.

Análise de dados não estruturados

Aqui é onde a mágica acontece de verdade. Temos clientes no agronegócio que recebem relatórios em PDF, WhatsApp, emails e planilhas bagunçadas. Antes, alguém tinha que ler tudo isso e extrair informações manualmente. Agora, um LLM processa tudo e gera insights estruturados.

Resultado prático: uma fazenda reduziu o tempo de análise de relatórios veterinários de 4 horas para 15 minutos. E com precisão maior que o processo manual.

Assistentes inteligentes para sistemas complexos

Essa é minha favorita. Em vez de treinar usuários em interfaces complicadas, você cria um assistente que entende linguagem natural e executa ações no sistema. É como ter um expert 24/7 que nunca esquece onde estão as funções.

Implementamos isso para um sistema corporativo complexo. Usuários podem perguntar, por exemplo, “qual foi o faturamento do mês passado?” e recebem a resposta diretamente, sem precisar navegar por dezenas de telas ou menus.

Geração de código e testes automatizados

Não, não estou falando de substituir programadores. Estou falando de acelerar tarefas repetitivas. LLMs são excelentes para gerar testes unitários, documentar APIs, criar scripts de migração e outras tarefas que todo desenvolvedor faz mas preferiria não fazer.

Onde você vai queimar dinheiro (casos superestimados)

Agora a parte que todo mundo evita falar: onde LLMs são um tiro no pé.

Tomada de decisões críticas

Se você está pensando em usar LLM para decidir investimentos, aprovar crédito ou diagnosticar doenças, pare. Agora. LLMs podem ser parte do processo, mas nunca a autoridade final. Eles “alucina” – inventam informações com a maior cara de pau.

Processamento de dados com 100% de precisão

LLMs são probabilísticos, não determinísticos. Se você precisa de precisão matemática absoluta, use ferramentas tradicionais de programação. LLM pode ajudar a interpretar resultados, mas não a calculá-los.

Substituição completa de workflows estabelecidos

Vi muita empresa tentando “LLMizar” processos inteiros de uma vez. Resultado: caos total. A abordagem que funciona é identificar pontos específicos onde IA adiciona valor e implementar gradualmente.

Como saber se seu problema precisa de LLM?

Criei um framework simples que uso para avaliar se vale a pena meter IA num projeto:

Teste do texto não estruturado: O problema envolve processar linguagem natural, documentos ou dados bagunçados? Se sim, LLM pode ajudar.

Teste da criatividade controlada: Você precisa gerar conteúdo variado mas dentro de padrões específicos? LLMs são ótimos nisso.

Teste da escala impossível: O volume de dados é grande demais para processamento manual, mas pequeno demais para soluções enterprise tradicionais? Zona de ouro dos LLMs.

Teste do especialista: Você precisaria de um expert humano para interpretar esses dados, mas não tem como ter um 24/7? LLM pode ser seu especialista digital.

Se seu problema passou em pelo menos dois testes, vale investigar. Se não passou em nenhum, provavelmente você está forçando a barra.

Cases reais que deram certo (e por quê)

Deixa eu contar três histórias rápidas de implementações que funcionaram.

Case 1: Análise de contratos

Um escritório de advocacia especializado recebia dezenas de contratos por semana. Cada um precisava ser analisado para identificar cláusulas específicas e riscos potenciais.

Implementamos um LLM que lê os contratos e cria um resumo estruturado com os pontos de atenção. O advogado ainda precisa revisar tudo, mas seu trabalho mudou de “ler 50 páginas” para “revisar 2 páginas de resumo”.

Resultado: 70% de redução no tempo de análise inicial, permitindo aceitar mais clientes sem aumentar o time.

Case 2: Atendimento técnico inteligente

Uma software house que desenvolve sistemas para cooperativas estava gastando uma fortuna com suporte técnico. Muitas dúvidas eram repetitivas, mas cada cliente tinha um contexto específico.

Criamos um assistente que conhece toda a documentação do sistema e consegue dar respostas personalizadas baseadas no perfil de cada cooperativa. Casos complexos ainda vão para humanos, mas 60% das dúvidas são resolvidas automaticamente.

Resultado: Redução de 40% nos tickets de suporte e aumento na satisfação dos clientes.

Case 3: Relatórios inteligentes

Uma empresa de consultoria coletava dados de várias fontes (sensores, planilhas, relatórios veterinários) e gerava relatórios mensais para os clientes.

Implementamos um pipeline que processa todos esses dados e gera relatórios personalizados em linguagem natural, explicando as métricas e sugerindo ações.

Resultado: Processo que levava 8 horas agora leva 30 minutos, e os clientes relatam que os relatórios ficaram mais fáceis de entender.

O segredo por trás dos sucessos

Analisando esses casos, percebo um padrão: todos resolvem problemas reais, com impacto mensurável, sem tentar substituir completamente processos humanos.

O segredo não está na tecnologia em si, mas em:

  • Identificar gargalos específicos, não problemas genéricos
  • Manter humanos no loop para validação e decisões críticas
  • Começar pequeno e escalar gradualmente
  • Medir resultados desde o primeiro dia
  • Aceitar que IA é uma ferramenta, não uma solução mágica

Para onde vamos a partir daqui?

A revolução dos LLMs está apenas começando, mas já podemos separar o joio do trigo. As empresas que vão se dar bem são aquelas que tratam IA como uma ferramenta poderosa para resolver problemas específicos, não como uma bala de prata universal.

Se você está pensando em implementar LLMs na sua empresa, comece fazendo as perguntas certas: que problema específico estamos tentando resolver? Como vamos medir se deu certo? O que acontece se a IA falhar?

Em um outro post podemos mergulhar nos desafios arquiteturais que ninguém fala: como estruturar sistemas que dependem de IA, lidar com latência, garantir segurança e não quebrar o orçamento no processo.

Por enquanto, lembre-se: o futuro não é sobre substituir inteligência humana com artificial. É sobre amplificar nossa capacidade de resolver problemas complexos com ferramentas mais inteligentes.

E isso, bem feito, pode mudar tudo.